sábado, 8 de novembro de 2014

222. UVAS #34 - KAMIDANA.


神棚 KAMIDANA.

As Artes marciais japonesas sempre "inspiraram" a imaginação de muitos, o que faz com que - de vez em quando - surjam "tradições" do tipo "os japoneses fazem assim", sem muita racionalidade ou fundamentadas em informação fidedigna. Assim sendo, antes de sairmos a inserir simbolismos japoneses "ao calhas" nas Artes Marciais, a primeira coisa que devemos fazer é SABER aquilo que vamos difundir.

Portanto, hoje vou abordar mais um assunto que é muito difundido, mas pouco entendido: o KAMIDANA.

Literalmente, a expressão KAMIDANA é composta por dois ideogramas: KAMI 神 ("Deus(es), divino(a)(s)") e TANA 棚 ("prateleira, estante").

Basicamente, o KAMIDANA é uma miniatura de um templo da RELIGIÃO SHINTÔ. (O problema já começa aqui, onde entra a religião no mundo marcial sem que se tenha noção exata do que isto representa!)

Como os ocidentais acham "bonitinho" ter uma "coisa japonesa" pendurada na perade do Dôjô, pouca ou nenhuma importância é dada ao real significado do KAMIDANA e os procedimentos a esta peça associados.

Em primeiro lugar, e o mais importante, na presença de um KAMIDANA as saudações no começo e final do treino obrigatoriamente MUDAM, pois é necessária a saudação HAIREI 拝礼... desnecessário dizer que esta saudação tem significado religioso! Da mesma forma que a expressão KAMIDANA, o termo HAIREI está dividido em dois ideogramas: HAI 拝 ("adoração, veneração, louvor a") e REI 礼 ("saudação, vênia, reverência"). Como pode ser visto, o primeiro ideograma já traz a carga religiosa. (Não é meu objetivo falar sobre religião, nem a quem este "louvor" ou "adoração" é dirigida, pois eu não acredito que religião deva se misturar com Artes Marciais (tudo tem sua hora e lugar).)

Em segundo lugar, o aspecto religioso do KAMIDANA leva à questão seguinte: quem honestamente tem as habilitações necessárias para inserir uma religião japonesa (Xintoísmo ou Budismo) em um treino de Artes Marciais? eu disse "honestamente"... 
Posso contar, usando os dedos de uma única mão, aquelas pessoas com habilitações religiosas e marciais necessárias e nenhuma delas é ocidental.

Para minimizar esta distância entre a fantasia e a realidade, irei indicar como é feito o HAIREI, sendo este utilizado em Dôjô que sigam o ensinamento Xintoísta (o que eu não conheço no ocidente).

- HAIREI -

1. Posicionar-se diante do KAMIDANA (de pé ou em Seiza). Fazer DUAS vênias formais (o corpo em um ângulo superior a 45 graus se Ritsurei (de pé) e a cabeça quase a encostar no solo em Zarei (em Seiza).

2. Voltar à posição inicial e bater palmas duas vezes à altura do peito, a mão direita um pouco abaixo. 
(Neste ponto há detalhes que eu não vou entrar.)

3. Fazer mais uma vênia formal.

Esta é a saudação que se espera diante de um kamidana que não seja um Kamidana "estético".

Conclui-se que a falta de conhecimento efetivo a respeito das tradições japonesas apenas complicam o que deveria ser basicamente muito simples: treinar uma arte marcial.

"Mas "aquilo" fica bonito na parede..."
Pode ficar "bonito na parede", mas fica horrível na observação e respeito à tradição japonesa.

Aprender certo, fazer certo.
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Aqui se pode ver o HAIREI feito corretamente no Japão, num templo Shintō (0:50 a 1:04):
靖国神社 みたままつり

E aqui está um vídeo do Steven Seagal executando o HAIREI diante de um Kamidana. (Não sei a razão pela qual ele bate palmas quatro vezes, mas...)


sexta-feira, 7 de novembro de 2014

221. UVAS #33 - Sentar à direita ou à esquerda?


Observe que a disposição do DŌJŌ obedece ao mesmo posicionamento, isto é, mais graduados à direita (KAMIZA/JŌSEKI) e menos graduados à esquerda (SHIMOZA/SHIMOZEKI).



sexta-feira, 31 de outubro de 2014

220. Olimpíadas - Tōkyō 2020

WORLD KARATE CAMPAIGN
JKF did too little, too late. Karate is out of Olympic now!

Almost two decades ago, when south Korea was going to host the Olympic, Taekwondo got the IOC majority and was fully recognised as an Olympic sport. Comparing Taekwondo and Karate; Karate was much biger and popular than Taekwondo at that time and of course still is. Everyone knows that South Korea's Taekwondo Federations had a successful strategy and earned IOC votes for its traditional martial art, Taekwondo.

Now, Tokyo will be hosting the Olympic games in 2020. Thomas Bach the president of the international Olympic Committee officially confirmed that karate will not be in Tokyo Olympics 2020. With Bach's announcment, JKF that has already been suffering from disunity in Japan has now lost many of its members including JKA. They now find themselves in a critical situation. Japanese Karstekas believe that JKF did too little, too late for karate to be in the Olympics 2020.

“A CAMPANHA DO KARATE MUNDIAL
A Federação Japonesa de Karate (JKF) fez muito pouco, muito tarde. O Karate está fora das Olimpíadas agora!

Quase há duas décadas atrás, quando a Coreia do Sul ia sediar as Olimpíadas, o Taekwondo obteve a maioria do Comitê Olímpico Internacional (COI) e foi completamente reconhecido como um desporto Olímpico. Comparando-se o Taekwondo e o Karate, o Karate era muito maior e popular do que o Taekwondo naquela ocasião e, é claro, ainda continua a ser. Todos sabem que as Federações de Taekwondo da Coreia do sul tem uma estratégia de sucesso e conseguiram os votos do COI para a sua arte marcial tradicional, o Taekwondo.

Agora, Tōkyō irá sediar os Jogos Olímpicos em 2020. Thomas Bach, o presidente do Comitê Olímpico Internacional confirmou oficialmente que o Karate não estará nas Olimpíadas de Tōkyō de 2020. Com o anúncio de Bach, a JKF que já tem sofrido de desunião no Japão, agora perdeu muitos dos seus membro, incluindo a Associação Japonesa de Karate (JKA). Eles agora encontram-se em uma situação crítica. Os karateka Japoneses acreditam que a JKF fez muito pouco, muito tarde para estar nas Olimpíadas de 2020.

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Antes de deixarmos as paixões à flor da pele falarem mais alto, vamos ver o que realmente está em jogo em se tratando da passagem de uma “Arte Marcial” a “Desporto Olímpico” e, para fazê-lo, nada melhor do que apresentar um exemplo prático: o Jūdō – um exemplo concreto de uma Arte Marcial com posterior inclusão nos Jogos Olímpicos.
Vamos, em primeiro lugar, conhecer esta arte e, só depois, tecer analogias com o Karate.
O Jūdō, de forma bastante simplista, é o aperfeiçoamento de técnicas de combate de duas escolas distintas de Jūjutsu (antiga arte marcial japonesa usada nos campos de batalha para “matar” outro ser humano), a saber: Kitō-ryū (de onde saíram as nage-waza “técnicas de projeção”)   e a Tenjin Shin’yō-ryū (de onde saíram as Katame-waza “técnicas de controle” do adversário – através de imobilizações, estrangulamentos e chaves às articulações – e as Atemi-waza “técnicas de pancadas em pontos vitais”).
Além destas três divisões, o Jūdō (antigo e contemporâneo) ainda apresenta mais duas: Kappō “Técnicas de reanimação” e Kata “formas preestabelecidas de treino formal”.
É exatamente este o Jūdō responsável pela derrota da coligação de escolas tradicionais de Jūjutsu em 11 de Junho de 1886, cuja competição iria decidir a arte a ser ensinada em organizações militares, departamentos de polícia e escolas, evento organizado pela Academia de Polícia Metropolitana de Tōkyō, no templo Yayoi, onde foram colocados frente a frente o Kōdōkan Jūdō vs. Totsuka Ha Yōshin-ryū Jūjutsu. Foram 15 combates, onde o Kōdōkan Jūdō perdeu 2, empatou 1, venceu 12!

"Sob os auspícios do Chefe da Polícia Metropolitana, uma grande competição foi arranjada entre ambas as escolas (Jūdō e Jūjutsu). Era uma batalha decisiva. Derrota teria sido fatal para o Kōdōkan. Mas, naquele torneio, para o qual foram selecionados 15 elementos de cada escola, o Kōdōkan venceu todos os combates, exceto dois e um que terminou em empate. Aquela brilhante vitória estabeleceu de uma vez por todas a supremacia do Kōdōkan Jūdō sobre todas as escolas de Jūjutsu."

Para quem conhece Jūjutsu, o Jūdō ter sido capaz de tal feito não seria possível apenas com as técnicas que se vê nos Jogos Olímpicos! Daí este Jūdō Olímpico ter permitido o ressurgimento do “neo- Jūjutsu” para suprir a falta de um Jūdō voltado à defesa pessoal efetiva.
Mas o Jūdō “evoluiu” e passou a ser Desporto Olímpico… aqui, o Jūdō começa a perder a sua efetividade como “arte marcial” e passa a ser “desporto”, pois as técnicas de Atemi (“ataques a pontos vitais do corpo humano” – que eram técnicas letais e, portanto, proibidas de serem usadas nos Jogos Olímpicos) e as Kappō (“técnicas de reanimação” – por já não se aplicarem) foram completamente suprimidas. Conclui-se, naturalmente, com o advento Olímpico, a “arte marcial”, perdeu.
Por outro lado, a inclusão do Jūdō nos Jogos Olímpicos popularizaram o Jūdō, fazendo que o número de praticantes esteja sempre a crescer. Isso é um aspecto positivo a nível de difusão do Jūdō, não como arte da guerra, mas como forma de união fraterna, o que é o preceito básico do tão famoso “Dō”, conhecido por todos nós e implementado da sociedade japonesa a partir da era Meiji.
Portanto um Jūdō sem Atemi ou Kappō é um Jūdō feito a 60% da sua total efetividade, o que está bastante longe da sua expressão prática ideal, mas, sejamos realistas, o período de guerras (Sengoku Jidai), os samurai já não existem e a necessidade de “matar outro ser humano” está longe de ser uma prioridade em treino marcial contemporâneo.
Devemos ter em mente que a ideia original de Kanō Jigorō (o fundador do Jūdō) sempre foi de completo apoio à competição, por achar que esta servia como aplicação – em tempos de paz – das técnicas do Jūdō e isso ficou bastante claro com a criação das competições Kōhaku em 1884.
Portanto, conhecidas as diferenças necessárias para que o Jūdō passasse de “Arte Marcial” a “Desporto Olímpico”, o que foi perdido e o que atualmente não se faz a menor ideia que ainda exista sobre o Jūdō original, podemos traçar comparações com o Karate e eliminar alguns “enganos” feitos e difundidos de forma (in)consciente.
Para começar, precisamos de saber o que significa ser o Karate como “Arte Marcial”: há pouca documentação a nível histórico do uso do Tōde (arte precursora do Karate atual) como “arte militar” usada em campos de batalhas e, portanto, a sua “eficácia” vem dos tempos de paz.
Mesmo que o Tōde seja um sistema codificado de combate efetivo originário nas artes mais antigas Chinesas, sendo  incorporadas às técnicas nativas do Reino de Ryūkyū (antigo nome de Okinawa, antes de invasão japonesa), o “produto final” é bastante recente. De fato, os registos históricos mostram que o Karate tal qual conhecemos hoje em dia tem pouco mais do que uma centena de anos apenas.
Aquilo que o Karate apresenta como “técnicas de socos” e “técnicas de chutes” visam áreas genéricas de ataque (Jōdan, Chūdan e Gedan) nunca entrando nos aspectos mais profundos sobre os pontos exatos a atacar. Pela documentação antiga, veem-se diagramas, desenhos, cartazes de pontos vitais usados pelas artes “Chinesas” (artes de cura ou combate) e – este é meu ponto de vista – estes grafismos nunca foram completamente explorados, estudados ou entendidos em Okinawa (isso é fácil de observar quando algumas escolas, a fim de minimizar esta deficiência de conhecimento, optam pelo endurecimento das mãos e dos pés a fim de que não seja necessário saber onde o ataque irá acertar, uma vez que o condicionamento das mãos e dos pés supostamente “garantem” a destruição do alvo necessária, mas estas mesmas escolas esquecem, com frequência, que o condicionamento das “armas naturais” acarreta na destruição ou inutilização do movimento natural das áreas condicionadas com o passar dos anos).
Nos períodos das guerras internas Chinesas com objetivo de unificar a China, no período feudal japonês onde os Shōgun viviam em guerra a fim de aumentar os seus feudos, “testar” as técnicas de combate era bastante fácil, saber os efeitos de um ataque a determinada área do corpo humano, cortar, esmagar, quebrar… tudo era possível e permitido, sendo tudo codificado nas artes militares.
Para complicar ainda mais a situação do Karate, historicamente este encontra-se dividido em Escolas (Kan), Associações (Kai), Estilos (Ryū), Linhas (Ha) etc… Cada uma destas divisões a “puxar para o seu lado”.
Há muito o que se diga sobre o Karate, tanto como “Arte Marcial” como “Desporto”, mas eu acredito que a inclusão do Karate como Desporto Olímpico, nesta altura, não seria benéfico para uma arte que ainda está em fase de organização (ou não).


domingo, 12 de outubro de 2014

219. Fujian...

O JOAQUIM E O MANUEL VÃO A PORTUGAL APRENDER KARATE.
Nas primeiras décadas do século XIX, o Joaquim morava no arquipélago dos Açores e decide que vai a Portugal aprender Karate. 
Passados alguns anos, Joaquim retorna de Portugal e diz que aprendeu Karate com o mestre "João" e funda a sua escola de Karate.
Algum tempo mais tarde, o Manuel, também residente nos Açores, vai a Portugal com a mesma finalidade: aprender karate.
Passados alguns anos, Manuel retorna de Portugal e diz que aprendeu Karate com o mestre "João" e, como o Joaquim, também funda a sua escola de Karate… contudo a escola do Manuel apresenta algumas características diferentes se comparadas com a escola do Joaquim.
E assim temos a história do começo do Karate no arquipélago dos Açores!
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O que está a faltar nesta estória?

1º - Pode-se afirmar que o Joaquim e o Manuel foram para a mesma cidade em Portugal? Indubitavelmente: NÃO! Um poderia ter ido para Lisboa e o outro para Faro. Um poderia ter desembarcado no Porto e o outro em Sagres… "Ir a Portugal para aprender artes marciais" é muito "vago" e não especifica absolutamente nada!

2º - Pode-se afirmar que o mestre “João” é a mesma pessoa que ensinou ao Joaquim e ao Manuel? Indubitavelmente: NÃO! O nome “João” por si só não diz nada… e, considerando-se que os nomes de família Portugueses também podem ser idênticos, afirmar que se trata da mesma pessoa é um erro de novato a nível de pesquisa histórica!

Portanto, não se tem informação suficiente para “afirmar”, com 100% de certezas de que o Joaquim e o Manuel tenham:
1 - estado no mesmo local em Portugal,
2 - treinado com a mesma pessoa ou
3 - aprendido a mesma coisa.
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Isso tudo para explicar, de forma simples, o que se passou com a história do Karate e da ida dos mestres de Okinawa a Fujian (China) para aprenderem artes marciais.

Em primeiro lugar, Fujian é uma província Chinesa (e não uma cidade ou um lugar minúsculo) com uma área de 121.400 Km2... Apenas para dar uma ideia, Portugal tem uma área de 92.090 Km2… ou seja, a província de Fujian, por si só, é maior que Portugal! 

Em segundo lugar, não sei se notaram, NINGUÉM diz para ONDE em Fujian foram os referidos mestres antigos. Lembrem-se: Fujian é maior que Portugal! Quem disse que os mestres de Okinawa foram exatamente para os mesmos locais em Fujian?

Em terceiro lugar, os mestres eram de Okinawa e estavam na China, as línguas são completamente distintas! Não seria de se esperar problemas como um “mestre João”, uma vez que a língua Chinesa é toda monossilábica?

E, para concluir, NÃO EXISTE QUALQUER DOCUMENTO OFICIAL que comprove a existência do “alegado” mestre “Rū Rū Kō” na China ou em Fujian. Estamos perante a mais um problema de pronúncia Chinesa por parte dos mestres de Okinawa? (Esta suposição é bastante plausível!)

Portanto, insistir em algo que não pode ser comprovado – já tendo equipas especializadas e habilitadas Japonesas e de Okinawa que falharam nesta “demanda” – parece-me ser como “procurar ninhos de cavalos”, uma vez que há muito mais coisas “sólidas” a nível de Karate com o que devemos realmente nos preocupar.

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

218. UVAS #32. Mostra-me o teu faixa branca...


Acho extremamente interessante o fato de que a maioria das pessoas esquecem a história.
Uma das lições mais básicas e elementares da história é a construção das pirâmides. 

Apenas a base sólida faz a solidez de uma construção.

Acho curioso, também, em estágios ser dada mais atenção ao ensino dos faixas pretas  - quando estes já vêm com certos "vícios" dos seus instrutores - e colocarem à parte os alunos de menor graduação (que são a base, o fundamento de uma escola).

Ou seja, começa-se por dar atenção ao topo da pirâmide e relega-se para segundo plano os seus alicerces, a sua base. O que se pode esperar? Justamente o que se tem visto! O desmoronar de inúmeras pirâmides.

Não é por nada que os mestres Japoneses de artes marciais insistem no KIHON, KIHON e KIHON! Mas continuamos surdos, cegos e mudos a este respeito! 

(^_^)


sábado, 4 de outubro de 2014

216. UVAS #30. Inconsistências.


Hoje vou divagar... simplesmente porque me apetece e porque este é o MEU blog!

NÃO CONTINUE A LER SE FOR DEMASIADO "SENSÍVEL"! 
(VERDADE! ATÉ PREFIRO QUE NÃO O FAÇA...) 

Estás avisado! 

Nessa historinha acima, a resposta do instrutor, na vida real e na maioria dos casos, pode ser: 

a) "Porque eu também não sei!" 
b) "Porque acomodei-me com o que me foi passado!" 
c) "Porque o que importa é <suar o karategi>!" 
d) "Porque eu sempre fiz assim!" 
e) Etc.. 

Este é o ponto em que estamos nas artes marciais japonesas ensinadas atualmente! 

Não é vergonha "não sabermos". Vergonha - mesmo - é contentarmo-nos com o pouco que sabemos! 

Li, algures, que "a arma mais letal do karate não eram as mãos ou os pés, mas um cérebro treinado"... De duas, uma: ou a maioria dos instrutores e praticantes ainda não sabe o que é Karate e, portanto, recusa-se terminantemente a usar o cérebro ou esta frase está completamente errada! 

Uma outra grande confusão que tem sido passada há gerações é a questão de que uma graduação DAN traz consigo "conhecimento efetivo". é por causa deste mito, isto é, de que "quanto maior for o número de Dan, maior será a maestria em uma determinada arte" é que se vê a corrida aos Dan. 2º, 3º, 4º, 5º, 6º 7º, 8º, 9º, 10º e mais além... tantos Dan! E quanto mais melhor! 

- "Ah! O Senhor "X" tem 547 Dan!" 
- "Nem me digas! O Senhor "Y" tem 1589 Dan e vai ao Japão todos os anos!" 
- "Mas isso não é nada! O Senhor "Z" é Sôke reconhecido no Japão e além disso tem milhares de artigos publicados nos mais variados e conceituados "sites" da especialidade!" 

O que isso significa exatamente? Para mim, nada disso aponta para um bom instrutor, porque o caráter não vem com a faixa, graduação, viagens, títulos ou "copy/paste"! Se és bom, és bom, se és trafulha, és trafulha! Não se muda uma personalidade de uma pessoa ao vestir-lhe um Karategi! 

Infelizmente já houve uma época em que eu também acreditava - ingênuo - nestas estórias, nestas tretas, neste embelezamento de determinados indivíduos... mas com o passar do tempo, esforçando-me para entender uma cultura que não era a minha, comecei a notar que alguns "conhecedores" (quase que "iluminados") não se esforçavam tanto quanto isto e faziam "parecer" que dominavam o assunto integralmente, dissimulando a sua falta de conhecimento com mais e mais Dan. 

Quem é que nunca passou por isso? Chega-se num estágio (pago) e não se pode fazer perguntas ao mestre que vem dar o estágio porque os "iluminados" já fizeram fila para ir almoçar com o mestre! 

Não se pode falar com os "iluminados" porque são, claro, "iluminados" e só falam com o pessoal da graduação deles!

Mas se conseguir falar com uma destas "sumidades", na realidade, basta um minuto de conversa com a "divindade" (quando ela permite, pois nem sempre está disposta a vir à terra falar com os meros mortais como nós, naturalmente) para que a sua torre, o seu templo de Dan e o seu pedestal efêmero começe a desmoronar. Desmoronam-se porque são baseados na mais pura e frívola vaidade, no "pavoneio" em mostrar para os outros quantos Dan a mais possui. Desmorona-se porque ao invés de buscar o conhecimento efetivo através do estudo sério, da pesquisa criteriosa, através de um trabalho contínuo e de um "gostar" verdadeiro do Karatedô, é movido por interesses muito particulares e, em muitos casos, bastante obscuros. 

Tenho conversado com pessoas, com as mais variadas graduações, nas mais variadas artes marciais japonesas... e sou capaz de citar os nomes de cada mestre que verdadeiramente faz juz a graduação que tem. Sou capaz de citar os nomes de cada um porque são raros (posso usar uma única mão para contar o número de mestres ocidentais que "sabem", que realmente têm experiência efetiva (prática e TEÓRICA) sobre as artes que ensinam. 

Eu compreendo o comércio, os interesses econômicos por trás da instrução marcial! Isso é completamente natural! O que eu não compreendo é o fato de que, estando transações monetárias em jogo, a qualidade do material vendido seja tão questionável! 

Tem-se dito que "só compra quem quer!", mas a realidade não é esta. A verdade é que há bons vendedores! 

- "Queres religiosidade? Procuras uma paz interior? Quiçá, meditação?! O Zen resolve isso!" 
(Porque todo faixa preta sabe Zen! Parece-me que vem com a faixa, acho eu...) 

- "Violência urbana?! Queres usufruir da arte da guerra?! Somos descendentes direto dos "samurais"... (Se precisar, até temos espadas!" (E, se trilhar a via do Ninja, temos ainda muito, muito, muito mais armas!!) 

Vende-se aquilo que o cliente quer! E, pode ter certeza... há muita criatividade à solta. 

Para poder separar o que é real do que é fantasia, para poder "comprar" exatamente aquilo que buscamos, seria necessário um conhecimento PRÉVIO... mas nós todos sabemos que não é isso que acontece! Em regra geral, alguém que não sabe nada, vai a um Dôjô e... 

Entramos no Dôjô e lá está um mestre, sentado numa pose budista qualquer e com 1238 Dan atados à barriga! 

-"Uau!" (Pensa o cliente.) "É a própria visão do paraíso!" 

- "Vou trilhar o Caminho da Paz interior e se alguém me chatear, dou-lhe um enxerto de porrada! Esta sim é "A" via: a paz interior do Zen + invencibilidade Samurai! Vou me tornar um Guerreiro da Paz!!" 

Engano puro e duro!

As artes marciais japonesas foram codificadas há muito tempo. Elas deveriam representar os valores ideais nos seres humanos: a disciplina, a retidão de caráter, o esforço verdadeiro. 

Mas o que fazemos nós? 

Brincamos aos Samurai invencíveis e leais discípulos - "até a morte" - do antigo código guerreiro chamado "Bushidô"! 

Brincamos aos Monges Shao-lin a sentar incomodamente sobre os joelhos numa paz infinita envolta em mistério e luz... Brincamos e brincamos! 

Um dia vamos cair na realidade de que as artes marciais japonesas são uma expressão cultural e, como tal, não está resumida a um punhado de chutes e socos ou imitar monges budistas!

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

215. UVAS #29. Romanização.



Quanto aos três sistemas oficiais de passagem dos ideogramas e caracteres japoneses para as letras do nosso alfabeto (Nippon, Hepburn e Kunrei), estes podem ser utilizados de acordo com a vontade de cada um. Eu uso o Sistema Hepburn porque - basta olhar os outros dois sistemas - é o mais parecido com as palavras no nosso idioma.

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Além dos nomes das escolas de Karate, inseri a palavra Jūdō nesta lista porque há uma curiosidade importante: mesmo que as palavras Judô (no Brasil sendo uma palavra oxítona) e Judo (em Portugal sendo uma palavra paroxítona) já estejam consagradas nos dicionários contemporâneos de língua portuguesa, NENHUMA destas duas palavras reflete a verdadeira transcrição fonética da palavra japonesa que, na sua forma original, apresenta "duas" vogais longas e, por isso, devem ser acentuadas de acordo para representar estes alongamentos vocálicos 

Se Judô e Judo estão corretas como estrangeirismo no idioma Português? Sim.
Se Judô e Judo estão corretas como trasncrição fonética japonesa oficial: Não!

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

214. UVAS #28 - Deuses, homens e o Budō.


Não há dúvida que muita coisa mudou nas artes marciais desde a restauração Meiji, mas, por razões difíceis de explicar, alguns assuntos permanecem "congelados no tempo". Um exemplo desta situação é a forma como a grande maioria dos praticantes de Artes Marciais Japonesas vê a transmissão do conhecimento marcial.

Um dos grandes problemas para efetiva compreensão da realidade marcial é que, aparentemente, ainda não há vontade efetiva para separar o que é verdadeiro do que é ilusão ou aquilo que gostaríamos como ideal daquilo que, indubitavelmente, é mesmo real. 

As pessoas esquecem, com frequência, que a história foi, é e será escrita por outros seres humanos e, seguindo esta linha de pensamento, é natural que alguns "embelezamentos" tenham sido inseridos na história a fim de dar maior (ou menor) credibilidade à história contada em cada transmissão do conhecimento.

Além disso, outro problema que é extremamente comum é achar que um mestre antigo, seja ele de que arte for, está acima dos meros mortais. Ninguém está acostumado a "questionar" um mestre. Isto seria considerado pela grande maioria dos praticantes de uma determinada arte como uma falha grave! Passível de expulsão daquele que ousou pensar em tamanha heresia! Para este grupo de indivíduos, cegos na sua própria ignorância (porque ignoram a realidade mais básica da interação humana), os mestres antigos são intocáveis: suas palavras, luz, seus ensinamentos, únicos!

O que será que causa tamanha cegueira coletiva?

Um mestre antigo foi um ser humano tão comum como eu, como tu, com acertos e (pasmem!) erros... erros tão banais como os erros que qualquer ser humano comete. Acham que os mestres antigos eram imunes à politicagem ou politiquices? Enganam-se! Acham que também não viam o que era mais "conveniente" para as suas escolas? Enganam-se novamente! Acham que nunca tiveram atitudes tão "humanas" como as nossas? Enganam-se mais uma vez!

Os mestres antigos tinham os seus altos e baixos, suas facetas louváveis e seus momentos menos "nobres", como qualquer pessoa de ontem, hoje e amanhã!

Elevar um mestre dos tempos antigos à categora de "Deus" ou "Semi-deus", inquestionável por si só é uma grande estupidez! Porque ele foi um ser humano e todos nós sabemos que "errar é humano", portanto esperar que um mestre seja "um humano perfeito" é uma ilusão irracional. E partindo-se do princípio que um mestre foi um ser humano, por que não questionar as suas decisões como fazemos no nosso dia a dia em relação àqueles que conhecemos?

Não existe um caminho que possa ser percorrido por pessoas diferentes, uma vez que ninguém caminha com os pés de outro. Portanto a "Via" é distinta para cada um. Se uma pessoa andou de uma forma, isto não quer dizer que a sua forma de percorrer o "caminho" sirva EXATAMENTE para outra pessoa. Portanto, é natural que alguém que raciocine um pouco seja capaz de entender que cada um vive a sua própria vida, com as suas próprias experiências e é este conjunto de momentos, esta sequência de "agoras" é que fazem de nós elementos únicos num universo de pluralidades. E é justamente isto que deveria se passar com o Budō...

"Mas o meu mestre deixou escrito que isso é assim!"

Caro amigo, Na realidade, o que o seu mestre deixou era "aquela forma" baseada nas suas experiências, no seu modo de ser... deixou o que julgava ser "o melhor" para ele, naquele dado momento, naquele contexto específico e inserido no seu (do mestre) circulo de atividades particulares, tendo verificado que os seus (do mestre) ensinamentos eram funcionais.

Contudo, não devemos esquecer que, diferente do que é feito hoje em dia, antigamente o treino marcial levava em conta as características de cada indivíduo em particular, adaptando as técnicas e os Kata a cada um de forma específica.

Nos dias de hoje, todos aprendem as mesmas técnicas, os mesmos Kata e esperam-se os resultados idênticos para pessoas diferentes... 

Será isto correto ou é mais uma daquelas "manobras monetárias" do ensino massivo?

Questionar, portanto, continua a ser a única forma de ver o que é melhor para si e é a fórmula correta para produzir melhores resultados, uma vez que copiar algo de forma cega e irracional nunca será a expressão verdadeira de si mesmo.

Conclui-se que não há absolutamente nada de errado em aprender com a experiência dos outros (com os mestres antigos) desde que este aprendizado seja útil para nós próprios, a fim de que possamos nos tornar melhores e não virmos a ser "uma cópia" de uma outra pessoa (ou de um outro mestre). 

Só atingiremos este raciocínio se formos capazes de entender que apenas existe nas artes marciais, no Budō o fato de um ser humano a transmitir o conhecimento a outro ser humano, sem a existência de Deuses, "divindades", semi-deuses ou pessoas que mereçam veneração, porque, numa análise elementar, só tu vives a tua vida, pois nenhum mestre andará com os teus pés!

Lembre-se sempre: não há Deuses ou semi-deuses sobre a terra e os seres humanos não devem ser venerados, mas respeitados. Sendo, o respeito, uma via de dois sentidos.
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domingo, 28 de setembro de 2014

213. UVAS #27 - A "força" do conhecimento.


212. Gongxiangjun / Kūshankū / Kōsōkun.

Hora de falar ao pessoal da Shōtōkan 松濤館, Shitōryū 糸東流 e Wadōryū 和道流...

Tomemos como ponto inicial o seguinte parágrafo:
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観空大(かんくうだい) 
クーシャンクーともいい、中国明朝の使節随随員で拳法の達人、公相君という人が伝えたといわれています。 
In 空手型全集(上)金澤弘和 

"KANKŪ-DAI 
Também KŪSHANKŪ, diz-se ter sido transmitido por uma pessoa chamada KŌSŌKUN, um emissário Chinês de ligação da Dinastia Ming (em Okinawa) que era especialista em QÚAN-F 拳法 (Kenpō)." 
In Karate Kata Zenshū (ue) Kanazawa Hirokazu. 
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Agora vamos ao que interessa! 

"(...)diz-se ter sido transmitido por uma pessoa chamada KŌSŌKUN". 

Uma vez que não sabemos japonês, a frase bem poderia ficar por aí (como tem ficado nas últimas décadas)... mas a realidade é que mesmo o nome Kōsōkun pode ser traduzido! E seguindo esta linha de pensamento, sabemos (ou refletimos sobre) o que a frase acima significa realmente? 

O interessante sobre este assunto é o nosso posicionamento histórico a respeito do Karate e os seus protagonistas principais. 

Sendo o nome de um Kata bastante conhecido em três dos quatro grandes estilos de Karatedō, o problema começa na tradução de 公相君 (Gongxiangjun / Kūshankū / Kōsōkun), onde temos: 

公 GONG / KŪ / KŌ - Público, oficial (oficializado), goernamental. 
相 XIANG / SHAN / SŌ - Oficial (posto hierárquico), conselheiro, ministro. 
君 JUN / KŪ / KUN - Sufixo que indica um homem conhecido. 

Assim sendo, 公相君 (Gongxiangjun / Kūshankū / Kōsōkun) seria traduzido literalmente como "O oficial governamental". (Isto não é óbvio? Não era ele um emissário Chinês da dinastia Ming?!) 

Eu acho que é pouco provável que alguém tenha um nome próprio como "oficial governamental". Então, quem era, qual era o nome de Gongxiangjun / Kūshankū / Kōsōkun? 

Este assunto só serve como material de pesquisa e para ver o quanto ainda não sabemos da história do Karatedō.


sábado, 27 de setembro de 2014

211. CARTAZES - KARATE.

Hoje vou apresentar um guia de referência rápida para quem quiser fazer cartazes sobre Karate o mais corretos possível. Vou mostrar o que está errado e como fazer o correto, explicando os porquês de cada afirmação.

Para tanto, dividi o assunto em quatro partes, mostrando seis tipos de cartazes:

Parte 1 - Acentos portugueses em palavras japonesas.
Parte 2 - Acentos japoneses.
Parte 3 - O uso do hífen em palavras japonesas.
Parte 4 - A solução mais fácil.

PARTE I - Acentos portugueses em palavras japonesas.

Dependendo do país em que se vive, há uma tendência muito grande em "adaptar" determinados vocábulos à linguagem nativa. Em alguns casos, ocorre mesmo o caso de "estrangeirismo" (adoção de uma palavra estrangeira pelo idioma nativo).
No caso da palavra Karate, há uma tendência no Brasil de escrever esta palavra como sendo uma palavra oxítona (sílaba tônica no final da palavra) através da utilização de um "e" fechado, isto é, com acento circunflexo. Por sua vez, Portugal utiliza um acento grave para o mesmo fim...

Brasil - Karatê. / Portugal - Karaté. (Fig. 1.)

Ambas as versões estão erradas porque já existem as palavras caratê/caraté nos dicionários portugueses, não sendo estas escritas com "K".

Assim sendo, as três formas corretas para escrever esta palavra são:

Karate - Transcrição direta da palavra japonesa (sem acento algum).
Caratê - Português escrito no Brasil (com acento circunflexo).
Caraté - Português escrito em Portugal (com acento agudo).
(Fig. 2.)

Curiosidade 1: Mesmo que no Brasil e em Portugal a palavra Karate seja oxítona (Br) / Aguda (Pt), isto é, a sílaba tônica é a última sílaba, em Japonês esta palavra é paroxítona (Br) / Grave (Pt), ou seja, a sílaba tônica é a penúltima sílaba, sendo pronunciada kaRAte (cate). (^_^)

Curiosidade 2: A palavra Jūdō. No Brasil esta palavra é escrita Judô (oxítona)... o que está 50% correto, uma vez que as duas vogais japonesas são longas, além de se aproximar bastante da pronúncia japonesa. Por outro lado, em Portugal escreve-se Judo (sem qualquer acento) e pronuncia-se "Júdo" (paroxítona/grave)...

O que interessa é: quando acentuamos uma palavra "japonesa", estamos a dizer que a vogal acentuada é "uma vogal longa". Na palavra karate não há vogais longas e, portanto, nenhuma vogal deve ser acentuada! 

O que leva ao ponto seguinte...

PARTE II - Acentos Japoneses. 

Em japonês, as vogais podem ser normais ou longas. em regra geral, a maioria das vogais longas japonesas são acentuadas com o acento "mácron", uma "barra" acima da vogal longa ("-"). A única exceção é o "i" que é grafado com duplo "i": "ii".

Na impossibilidade de utilizar o acento mácron ("-"), as regras de transcrição fonéticas japonesas permitem que seja utilizado o acento circunflexo ("^") para o mesmo fim. Por exemplo: Shitōryū ou Shitôryû <- Ambas estão corretas.

Escrever as palavras japonesas sem acento que indique as vogais longas é tão errado como escrever as palavras Portuguesas sem acentos respectivos. (Fig. 3.)
Portanto, um cartaz feito corretamente deve refletir a correção da acentuação das palavras japonesas. (Fig. 4.)

PARTE III - O uso do hífen em palavras japonesas.

Até hoje não há uma regra específica sobre a utilização (ou não) de hífen para separar sílabas, palavras ou expressões japonesas. Portanto fica a critério de cada um. (Fig. 5.)

PARTE IV - A solução mais fácil.

Se na altura que estiver a criar um cartaz não quiser levar nenhum dos pontos acima em consideração, há uma solução que permite que todos os aspectos formais sejam colocados à parte e, mesmo assim, apresentar um cartaz completamente correto. Basta que acrescente, em letras pequenas, como nota de rodapé, a seguinte frase:

"INTENCIONALMENTE SEM SISTEMA DE TRANSCRIÇÃO FONÉTICA JAPONESA."

Ao indicar isto em um cartaz, o autor reconhece a existência de um sistema oficial de transcrição fonética (forma correta de escrever as palavras japonesas com o nosso alfabeto), mas DECIDIU não o utilizar..(Fig. 6.)
Assim, sem esforço algum, o cartaz fica correto dentro das normas de correção para palavras japonesas utilizadas em Karate.
É a melhor solução? Não, não é. Mas é melhor do que apresentar um cartaz errado!

"O outro lado da moeda". A "solução mais fácil" não é a alternativa que se espera de um Karateka. O facilitismo, o "jeitinho", a acomodação são coisas de quem não sabe Karate.


segunda-feira, 26 de maio de 2014

205. "O KI" é isso?!

Não há, nas Artes marciais Japonesas ensinadas atualmente, algo tão falado, tão “teorizado” como uma “energia vital” – chamada “KI” em japonês – que deve ser utilizada durante a vida do iniciado marcial…

Mas a grande realidade é que o conhecimento mínimo necessário para “saber” (e ensinar) os assuntos específicos e os tópicos importantes relacionados com esta “energia vital” parece terem sido perdidos com o passar do tempo.

No meu caso em particular, a “energia vital” sempre teve o seu lugar na minha “lista de coisas a saber”, mas sempre surgiam outras dúvidas mais “urgentes” para as quais eu tinha de ter resposta imediata, dúvidas tais como:

- Por que Miyamoto Musashi usou caracteres Sânscritos quando escreveu o Gorinsho?

- Por que Buzāganashii é usado no Gōjūryū?

- Por que se dizia haver três polos de prática de Karate em Okinawa?

- Por que era questionável a divisão dos Kata de Karate feitas por Funakoshi Gichin?

E assim por diante.

No momento tenho respostas fundamentadas e verificáveis para todas estas dúvidas, mas as respostas só vieram com bastante trabalho e pesquisa… trabalho que solidificou no que eu tenho por “conhecimento pessoal”.

Contudo, nos últimos anos, com a constante “desmitificação” das artes marciais japonesas através da pesquisa e estudo sérios, tornou-se bastante evidente que o assunto “energia vital” tão falado pelos mestres antigo, “tinha” papel importante na história das Artes Marciais orientais, mas a sua importância foi substituída pelo misticismo irrefletido.

Neste mês, então, resolvi que deveria “saber” o que é, como se processa no interior do corpo humano e as aplicações reais em combate desta “energia vital”.

Iniciados os trabalhos de pesquisa histórica e de prática sistemática de exercícios com objetivo de “conhecer” esta energia, fiquei inacreditavelmente surpreso com os resultados visíveis após uma semana de prática de “exercícios de correção do fluxo desta energia”!

Não só passei a me sentir com muito mais disposição física durante o dia inteiro como – agora que estou a rever todos os kata de base do Gōjūkai – as técnicas apresentam-se com bastante mais “Kime”, podendo ser feitas por mais tempo sem cansaço.

Como sou bastante cético, tendo em consideração o conhecimento precário (quase inexistente) que eu ainda tenho sobre este assunto neste momento, ocorreram-me duas teorias (a serem verificadas na medida do desenvolvimento e solidificação do conhecimento a este respeito):

1ª teoria – O assunto “energia vital” (KI) não passa de um “placebo”, isto é, “um remédio que não faz absolutamente nada, mas o paciente acredita na cura e, portanto, o remédio “parece fazer efeito”… ou seja o paciente auto sugestiona-se e o “milagre” acontece.

2ª teoria – O assunto “energia vital” (KI), na realidade, apresenta resultados significativos e compreensíveis a nível de condicionamento físico e, consequentemente, deve ser melhor entendido por todos que realmente seguem as tradições das artes marciais japonesas.

Uma coisa é certa: a medicina oriental tem mais de quatro mil anos de prática, a medicina ocidental… bem, tem bastante menos idade, contudo os focos de tratamento de ambas são bastante distintos, enquanto uma vê o paciente como um “organismo único”, a outra vê a doença como causa a ser eliminada… Ambas medicinas e suas formas de ver o ser humano têm seus pontos fortes e pontos fracos… Mesmo que este assunto não seja a minha preocupação iminente, vai ser necessário abordá-lo a fim de poder entender como as antigas artes marciais eram praticadas em se tratando de pontos a atacar.

Contudo, duas semanas a aprender não são absolutamente NADA em se tratando de “conhecimento efetivo”… as únicas duas coisas que pude concluir, com certeza, nestes últimos dias foram:

1 – Com o assunto “energia vital” (KI), vou ter assunto de pesquisa até morrer!
2 – E é mais do que óbvio que vou morrer sem saber tudo que gostaria de saber!

(^_^) Tão natural como isto!