domingo, 28 de junho de 2015

228. Como escalar uma montanha.



O que significa escalar uma montanha? Significa fazermos aquilo que nos propomos, mesmo que inicialmente a nossa ideia represente uma barreira quase intransponível.

Tudo começa com a “Vontade”, a “determinação”, o “espírito”. Deve-se querer realmente atingir um objetivo: passar nos exames escolares, saltar de pára-quedas, aprender um novo  idioma, PRATICAR UMA ARTE MARCIAL etc..

A esta “DETERMINAÇÃO”, os japoneses chamam de SHIN “ESPÍRITO”, isto é, aquilo que nos impele a sempre ir mais e mais além, superando as nossas próprias fraquezas e dificuldades.

A seguir, devemos saber “COMO” realizar o que nos propomos. Há sempre uma forma eficiente, eficaz, ineficiente ou ineficaz para fazermos tudo. Saber a forma correta, as técnicas necessárias para executar a nossa tarefa é, por isso, muito importante!

A este “SABER COMO”, os japoneses chamam de WAZA “TÉCNICA”, isto é, os meios necessários para atingir o objetivo e que sejam o mais eficientes possível.

Por fim, devemos estar minimamente aptos para executar aquilo que nos propomos, a nossa condição pessoal: física e mental..

A este “CONDICIONAMENTO FÍSICO”, os japoneses chamam de TAI “CORPO”, ou seja, o quão preparados fisicamente estamos para atingir o nosso objetivo.

Numa primeira fase para atingir a nossa meta, estes três princípios são suficientes para garantir uma subida bastante segura até ao topo da montanha e podem ser dominados através de uma PRÁTICA consistente.

Mas, à medida que o tempo passa, começam a aparecer dúvidas sobre se queremos ou não seguir em frente, sobre qual seria a melhor técnica (ou, em alguns casos, a mais rápida) e se estaríamos realmente em condições de atingir os objetivos inicialmente traçados.

É justamente neste ponto que um CONHECIMENTO PROFUNDO, uma consciência mais ampla sobre a atividade que executamos são necessários e, para isso, entender os porquês do que fazemos é essencial. A TEORIA irá fundamentar a PRÁTICA e a PRÁTICA irá validar (ou não) a TEORIA. Portanto, para que se seja capaz de prosseguir adiante, é necessário que o conhecimento teórico acompanhe o desenvolvimento prático.

A este processo onde "A TEORIA E A PRÁTICA SÃO FEITAS COMO UMA ÚNICA COISA”, os japoneses chamam de BUNBU-ICHI 文武一.

O objetivo final da nossa escalada é que possamos subir a montanha (enfrentar uma dificuldade) sem que qualquer tipo de dúvida ocorra em momentos cruciais, o que poderia ser extremamente fatal (em todos os aspectos a respeito do que nos propomos atingir)! E devemos escalar a montanha de forma quase instintiva, sem que haja a necessidade de recorrer aos pensamentos de forma consciente para o fazer.

A este “NÃO SENTIR E NÃO PENSAR”, os japoneses chamam de MUNEN MUSO 無念無想. Fazer o que nos propomos sem hesitações, porque só fazemos algo realmente SE soubermos – de fato – o que estamos a fazer.

Diante das nossas montanhas do dia a dia, estamos sós, sem mentiras, sem enganos, sem desonestidade, porque enganar os outros é fácil, enganarmo-nos a nós próprios é difícil… pois quem engana a si próprio vive com medo dos outros.


quarta-feira, 13 de maio de 2015

227. A cor "BRANCA".

Tem havido nas últimas décadas, em se tratando de Artes Marciais Japonesas, uma tendência a achar que a cor "branca" representa "a pureza", "a volta à inocência", "o retorno ao princípio"... e, por causa desta "tendência" disparatada, inúmeros são os instrutores que deixam as suas faixas pretas ficarem em farrapos ou em completo mau estado de conservação apenas para comprovar o "tempo de prática".
Vejamos, então, alguns fatos que deveriam ser levados em consideração ANTES de se criarem "tendências" que, na maioria dos casos, são irracionais.
Em primeiro lugar, no caso das faixas pretas, a maioria dos instrutores ocidentais simplesmente esquece da tradução do nome da primeira faixa preta, ou seja, SHODAN! Assim, vamos relembrar a tradução e a consequente fundamentação do uso errado de faixas em mau estado de conservação.
A palavra SHODAN é escrita, em japonês, utilizando-se dois ideogramas: SHODAN 初段. Sendo que 初 SHO - "Início", "inicial", "começo" (...) e 段 DAN - "Nível".
Portanto, COMEÇA-SE o treino de uma determinada arte na "primeira" faixa preta. Sendo o preto inicial "a origem", "o começo" da vida do praticante. Agora, a lógica por trás da tradução: se a primeira faixa preta traduz-se por "nível inicial", qual é a lógica em deixar aparecer o seu interior branco?
Basicamente um "modismo" que foi usado por um ou outro mestre Japonês e que foi "copiado" por um número incontável de ocidentais porque "parece" ser mais "cool".
Assim, a tradução do termo SHODAN por si só indica que o uso da cor "Branca" nada tem a ver com o sentido de "retorno às origens" em se tratando de faixas pretas, deixar que a faixa fique em mau estado é um mito irracional. Estupidez.
Por outro lado, antigamente os Dōgi (Jūdō-gi, Karatedō-gi, etc.) eram feitos em pequenas instalações ou em casa, basicamente manufaturados de algodão não tratado (até o cheiro era característico ^_^ ). Para quem é antigo como eu, sabemos que os Dōgi daquela época COMEÇAVAM com uma cor "amarelada" e com o passar dos anos de prática e inúmeras lavagens estes mesmos Dōgi ficavam imaculadamente "BRANCOS"! Aqui sim, justifica-se a cor "Branca" como trazendo em si mesma o seu significado de "tempo de prática" (conceito que os ocidentais deturparam, transformando esta ideia em uma faixa porcamente mal tratada). Mas o assunto acaba aqui?
Claro que não! A capacidade humana de se superar é impressionante, principalmente quando faz porcaria!
Além das faixas esfarrapadas e em mau estado de conservação, começaram a surgir Dōgi "de marca" - bastante caros, diga-se de passagem - e excessivamente "engomados"... com o objetivo único de "fazerem barulho" para indicar que alguém está a usar KIME, sem que isso seja necessariamente verdade (vou traduzir, neste contexto, a palavra KIME por "energia de execução das técnicas")!
Voltemos aos Dōgi originais, aqueles feitos em casa... os Dōgi "amarelados" só faziam algum "barulho" se "REALMENTE" existisse KIME (energia) e, portanto, eram um indicador fidedigno do esforço de quem os envergava!
Hoje em dia, basta que alguém dê um passo e já somos capazes de ouvir o Dōgi a fazer barulho! Ah! O karatedō... quanto se paga por um KIME?! 
Para mim, que venho dos Dōgi antigos feitos artesanalmente, isso é simplesmente patético, porque não representam, nem de longe, o real empenho daqueles que deveriam ser expoentes nas artes que praticam.
Fala-se muito em tradição e valores do Bushidō, mas se formos analisar a situação atual, iremos encontrar vários exemplos de "tradições e valores" adaptados às conveniências do "peixinho a ser vendido"!
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"Nada é tão bom que não possa melhorar e nada é tão mau que não possa piorar!"
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domingo, 26 de abril de 2015

226. O CALHAU E O KARATEKA.


Há um assunto que eu venho falando há anos, mas a maioria dos instrutores tem se feito de surdos, mudos e cegos... E o que acontece, então?

As consequências dessas posturas de negação do óbvio são visíveis no nosso dia a dia - em maior ou menor grau.

Eu poderia dizer que não sei qual é o motivo para haver uma predisposição - perigosíssima -  da maioria dos insrutores ocidentais em achar que "se é do Japão, é melhor!" ou "todo mestre Japonês tem bom caráter!". Mas isso seria mentira! Porque eu sei bem o motivo que valida "a galinha da vizinha ser sempre melhor do que a minha"!

É uma predisposição perigosíssima porque parte de um pressuposto completamente errado, ou seja, de que os mestres japoneses NÃO SÃO HUMANOS!

Muitos instrutores partem do princípio de que os mestres japoneses estão "acima dos demais mortais"... chegando mesmo a "venerar" alguns!

O que os instrutores ocidentais esquecem é a informação mais elementar e básica a respeito dos seres humanos: todos nós, pertencentes à raça humana, ERRAMOS, FALHAMOS, COMETEMOS ERROS, METEMOS O PÉ NA POÇA, DESNORTEAMOS, TEMOS MOMENTOS MAUS (MUITO MAUS, PÉSSIMOS), PRECIPITAMO-NOS, DIVAGAMOS, etc..

Esta característica de serem "cegos à realidade que os rodeiam" é bastante fácil de encontrar quando leio livros sobre artes marciais e raramente, muito raramente vejo uma análise correta das Artes Marciais onde é levado em consideração o "fator humano" dos mestres antigos. O problema é que, sem esta análise de comportamento humano é IMPOSSÍVEL determinar aevolução natural do Karatedō até aos dias de hoje, porque a história do Karatedō está marcada por encontros e relacionamentos humanos!

Como em qualquer parte do planeta, há pessoas boas, há pessoas medíocres e há pessoas más. Também existem bons instrutores, instrutores medíocres e maus instrutores! ISSO É IMFORMAÇÃO ELEMENTAR!

No ocidente isso se torna ainda mais complicado porque "a outra galinha é a melhor!"

Por exemplo, no dia 23 de Setembro de 2013 eu escrevi neste Blog o seguinte:

"Isto só confirma a 100% o que eu venho dizendo já há alguns anos: não é por ter "cara" de japonês, por ser "descendente" de japonês ou mesmo por "ser" japonês que uma pessoa sabe e vive a tradição e cultura japonesa antigas!"

E acrescentei:

"Tenham certeza também que há muito japonês "armado" em "mestre" apenas por causa da aparência! "

Adiantou alguma coisa o aviso? Claro que não!

Para piorar a situação, muitas das pessoas que caem no "velho truque" das aparências são pessoas com um grau de escolaridade elevada, com trabalhos publicados a respeito das artes marciais japonesas... mas que não aprenderam coisa alguma com os trabalhos que fizeram!

E por que eu afirmo que elas não aprenderam nada com os trabalhos que fizeram? 

Porque continuam a deixar o aspecto "humano" dos mestres das Artes Marciais Japonesas de fora da equação, fora dos seus trabalhos e, por isso, não têm a visão completa do assunto que estão a divulgar.

Infelizmente, mesmo com o aparecimento de mais e mais pessoas interessadas em pesquisas e estudos a nível das Artes Marciais Japonesas, os ocidentais parecem ainda estar "estupidificados", "entorpecidos" diante da cultura nipônica e, por causa disso, frequentemente esquecem de usar o cérebro a fim de analisarem as situações com clareza e objetividade necessárias na convivência e relacionamento entre os seres "humanos".

É desta falta de análise elementar que surgem os "misticismos", as más interpretações, a religiosidade inadequada... enfim, o KARATE (sem sufixo) para justificar uma pura estupidez  ou simples malandragem mental!

Eis que surge a questão: o que é mais válido? Um Karateka cego pela própria ignorância (geralmente - por mais incrível que isso possa parecer - em prejuízo próprio) ou um calhau que, pelo menos, fica no seu lugar, sem sobrevalorizar seja quem for? (Se bem que, em regra geral continua-se a achar que os japoneses são os melhores.)

Volto a dizer: há o bom, o medíocre e o mau em TODO O PLANETA!

Custa-me ter de repetir as mesmas coisas dia após dia, mas, quem sabe, um dia, o pessoal vai "acordar" e ter maturidade suficiente para pararem com venerações estúpidas, deixarem de ver apenas as conveniências sociais de estarem ligados a este ou aquele mestre - novamente - "japonês" (saltando de galho em galho à procura do "melhor japonês") e buscarem o que realmente interessa: "o saber"... e "saber" cada vez mais!

Deixemo-nos de hipocrisias! Não devemos "proteger o Caminho da Verdade" apenas quando nos convém! Tenham tomates para assumir esta postura nos seus dia a dia ou, então, parem de citar algo apenas porque fica bonito como palavras de um Dōjōkun.

segunda-feira, 13 de abril de 2015

225. JUSTIÇA E FAZER O QUE É JUSTO.

Há um grande número de praticantes de artes marciais japonesas que se consideram verdadeiros “samurais”, seguidores do Bushidô e dos elevados padrões dos guerreiros japoneses feudais.

É fácil encontrar as sete virtudes do Bushidô (1) Retidão ou Justiça - SEIGI 正義, 2) Coragem - YUKI 勇気, 3) Benevolência - JIN'AI 仁愛, 4) Polidez / educação - REIGI 礼儀, 5) Sinceridade ou devoção - SHISEI 至誠, 6) Honra - MEIYO 名誉, 7) Lealdade - CHUSETSU 忠節) sendo citadas como se as pessoas que as citam vivessem num universo ou século paralelo, no qual andariam com espadas à cintura e a defender a justiça (apenas de forma hipotética ou lúdica, naturalmente).

Ah! Isso seria tão bom! Nutrir um mundo justo e honrado!

A este respeito, referiu-se o Mestre de Karatedô, Funakoshi Gichin, nos seus “Vinte Preceitos”:

一、空手は義の輔け。Hitotsu, Karate wa gi no tasuke.
"Importante, o Karate é um assistente da Justiça."

Será mesmo? (Se é que alguém chegou a “perder tempo” em pensar nisso…)

Uma coisa é o sonho a ilusão dos “samurais contemporâneos”, daqueles que criam “«novas» tradições para atenderem às suas conveniências" muito particulares, quer pela necessidade de bajulação, quer por pura vaidade, quer pela necessidade imatura de "poder" (em regra geral, são criadas conveniências que impliquem sempre "o menor esforço possível"), da mesma forma, aquilo que o Mestre Funakoshi deixou escrito – se não colocadas em prática; outra coisa é a realidade atual, pura e dura!

Nos dias de hoje, não andamos com espadas à cintura com ar desafiador e olhar aguçado, nem usamos Hakama ou kimonos pelas ruas. Vivemos num mundo onde os campos de batalha são muito mais sutis e, em certa medida, muito mais perigosos, porque a “retidão” apregoada por muitos não é tão “reta” como aparenta ser.

Por outro lado, todos os dias, nós temos a chance de sermos justos, todos os dias nós temos a chance de viver como viveram realmente os antigos Samurai. E isso só depende do “quão justa é a nossa justiça”.

Agora cabe a cada um pensar no seguinte: o que tenho feito eu a fim de que o mundo seja mais justo? Luto realmente pela retidão (de comportamento e opiniões)? Luto por valores elevados, como os fundamentos do Bushidô? Ou acomodo-me (acovardo-me) e encolho-me num canto? Esperando que o tempo passe e que tudo se resolva sem a minha intervenção...

Há uma definição de insanidade que diz o seguinte: "Insanidade é fazer tudo da mesma maneira, dia após dia, e esperar resultados diferentes." 

Não estaremos a ser simplesmente insanos dia após dia?

domingo, 29 de março de 2015

224. 武 BU!

Hoje vou cometar mais um ideograma japonês que, para mim, é mais um daqueles exemplos de conceitos mal interpretados no ocidente. Refiro-me ao ideograma 武 "BU", usado em palavras como BUJUTSU ou BUDŌ.

Vamos, antes de mais nada, "entender " a ideia por trás deste ideograma e, desta forma poder situar as interpretações que agora conhecemos.

No nosso dia a dia, ortograficamente falando, o ideograma BU é visto como um único caracter, é visto como "um todo" a ser escrito... Simples assim! Mas, na verdade o ideograma BU é o resultado da junção, da composição de "dois" ideogramas específicos, a partir dos quais podemos entender a ideia que este transmite. 

O ideograma BU foi criado a pardir dos seguintes ideogramas: 

KA 戈 - "alabardas", "lanças" e 

SHI 止 - "parar". 

Usando-se, então, estes significados, é criado o ideograma que já conhecemos, isto é, graficamente, fica-se com a "ideia" de que BU seria, literalmente, "parar as alabardas (lanças) (inimigas)".

BU 武 - ideia original: "parar as lanças inimigas".

Mas, na prática, o que significa "Parar as lanças inimigas"?

A nível dos clássicos militares antigos (chineses e japoneses), existem duas opções disponíveis para "parar as lanças inimigas": a via diplomática (pacífica) e a via belicista (guerra). Isto quer dizer, sem qualquer dúvida, que há formas distintas de resolução de conflitos. Há, portanto, opções claras e opostas para "parar as ações violentas dos inimigos".

De qualquer forma, esta visão de "dualidade de opções" foi sendo transformada com o passar dos tempos, de tradução em tradução, chegando ao termo "marcial", utilizado nos dias de hoje. De fato, eu não sei quem foi o primeiro autor ou primeiro indivíduo a sugerir a palavra "marcial" para o ideograma BU, mas esta tradução veio a causar muito mais inconvenientes do que oferecer uma tradução que se aproximasse a ideia original do grafismo chinês ou japonês.

E por que eu digo isso? Porque "Marcial" refere-se ao Deus Marte, o "DEUS ROMANO DA GUERRA". Como podem ver, "DEUS DA GUERRA" refere-se e indica uma opção única, isto é, a guerra em si mesma, o que não está de acordo com os ideogramas orientais originais.

Na verdade, tanto na China como no Japão, "BU" é traduzido por "militarismo" e não "marcial" e, no militarismo, as vias diplomatícas e da guerra estão presentes!

É justamente aqui que reside a diferença de "mentalidade" entre o que é praticar o BUDŌ como "Via marcial" ou praticar o BUDŌ como "Via militar".

Diferente do que é atualmente apregoado na esmagadora maioria das escolas de "artes marciais", o treino MILITAR difere consideravelmente do treino MARCIAL.

Que fique bem claro: a tradução de BUDŌ 武道 é "Vias Militares" e NÃO "vias marciais"... com tudo que isso possa implicar.

Este assunto poderia gerar um livro, explicando as razões porque a interpretação correta dos ideogramas e cultura japoneses seriam responsáveis pela mudança radical na forma de treino do BUDŌ contemporâneo. 

Contudo, não é meu objetivo escrever qualquer livro explicando o que já deveria ser do conhecimento geral, uma vez que há sempre autores sempre afoitos e dispostos a difundir material sem que sejam feitas pesquisas prévias e fundamentação fidedignas das informações apresentadas.

223. Conceito tático: "YOMI".

Para aqueles que estudam as artes militares, os conceitos de Estratégia e Tática são bastante claros. Contudo, em se tratando do ensino contemporâneo de Artes Marciais, conceitos que deveriam ser simples, devido a erros de tradução do Japonês para os idiomas ocidentais ou simplesmente por más interpretações de autores diversos, assumem significados bastante distintos daqueles descritos nos clássicos militares das culturas mais antigas.

Este é o caso do termo Japonês "YOMI", usado por muitos, entendido por poucos.

Em primeiro lugar, vamos "entender" sobre o que falamos, começando pela tradução deste termo: o radical YOMI 読み vem do verbo YOMU 読む que significa "Ler". Portanto, a tradução de YOMI é "leitura".

Mas o que significa "leitura" para os praticantes de artes marciais japonesas dos dias atuais?

É ideia generalizada no ensino das Artes Marciais dos nossos dias que "YOMI" seria a capacidade de "ler o inimigo", saber antecipadamente o que o inimigo iria fazer ou estaria pensando.

Mas estará esta interpretação correta? Este conceito abrange "tudo" que a expressão YOMI poderia representar?

É evidente que precisamos de mais informações para podermos tirar alguma conclusão definitiva.

Na realidade, esta afirmação está longe da realidade a nível tático. Por quê? Porque à expressão "YOMI" podem ser acrescentados dois sufixos japoneses para indicar o maior ou menor grau de "leitura", isto é:

YOMIYASUI 読み易い "Fácil de ler".
YOMINIKUI 読み難い "Difícil de ler".

A partir deste ponto, muitas conclusões podem ser tiradas, mas a mais elementar é a seguinte: uma tática irrefletida ou um mau posicionamento estratégico leva, geralmente, à derrota!

É natural que num ambiente controlado como o de uma escola ou associação de Artes Marciais, a "leitura" de um colega (que conhecemos a longo tempo) ou de um companheiro de treino (do qual conhecemos suas Tokui-waza - "Técnicas nas quais somos bons") pode ser bastante fácil! 

Por outro lado,  nas competições ou nas brigas de rua, a "leitura" do inimigo pode ser uma tarefa bastante difícil, uma vez que não conhecemos as suas fraquezas e os seus pontos fortes. Portanto, precipitar-se no julgamento do adversário apenas pelo que este "aparenta" à primeira vista pode ser um erro grosseiro e fatal, onde podemos perder uma medalha ou a vida!

Assim sendo, todo praticante de Artes Militares deveria ESTUDAR os clássicos militares disponíveis a fim de que conceitos que sempre foram transmitidos de forma sólida fossem aprendidos o mais corretamente possível e não através de ideias fragmentadas que induzem ao erro e a más práticas.