*** Artigo destinado a instrutores de Vias Marciais japonesas. ***
No mundo das Vias Marciais
japonesas, o contexto é muito importante… o contexto histórico, o contexto
social etc.. Neste sentido, as graduações não são exceção. Elas também estão
ligadas ao “contexto”. Um exemplo disso é a afirmação, muito conhecida entre
instrutores de Jûdô, Karate, Aikidô etc. de que “para faixa amarela ninguém
reprova”. Essa afirmação é completamente válida se levarmos em consideração o contexto
de atribuição de uma graduação como incentivo para que o aluno continue o
treino.
Foi pensando neste contexto em particular
– do incentivo – que se desenvolveu o Sistema Kawaishi de graduações,
amplamente difundido no ocidente (neste sistema existem as faixas: Branca,
Amarela, Laranja, Verde, Azul, Marrom (Castanha) e Preta – essencialmente para
manter o interesse dos ocidentais no treino… e foi bastante acertada esta
alteração das cores das faixas) em contraste com o sistema original japonês: Branca, Marrom (Castanha) e Preta.
Assim, como “incentivo” – e por
ser “incentivo” – as exigências foram reduzidas ao mínimo e, confirmando a
regra, ninguém, na realidade, reprova para a faixa amarela!
Contudo, será que essa afirmação
é realmente válida num outro contexto?
Por exemplo, esta “não exigência” técnica (notem bem que eu nem estou a falar na exigência teórica!) é extremamente prejudicial para o praticante a longo prazo porque o aluno acostuma-se à “brandura” e a “não necessidade de buscar sempre mais” do exame de graduação e, numa graduação mais avançada, se não aprovado, culpará sempre o instrutor… por não o ter incluído na lista de exame, por não o ter aprovado e assim por diante... E, se os alunos são pequenos (crianças), os próprios pais encarregam-se de fazer pressão sobre o instrutor para "agilizar" a graduação - venha ela como vier! (^_^) Fazendo com que as graduações, além de incentivo, passem a ter um "caráter obrigatório"!
Eu sei que neste ponto alguém vai
colocar o dedo no aspecto “sócio-económico” da coisa, mas o meu interesse está, à partida, no "conhecimento" efetivo do aluno e o seu desenvolvimento gradual e constante. De fato, são inegáveis os diversos aspectos de gestão do Dôjô… mas os alunos também não o são?
Esta "brandura", esse “deixa lá porque ele(a)
é amarelo (laranja, verde ou azul)…”, além de permitir muitas situações
constrangedoras nos exames de graduação, cria a situação mais patética que pode
ser vista constantemente nos exames de graduação para Shodan (“Nível inicial” –
quando se recebe a primeira faixa preta): são as exigências técnicas quase às raias da irracionalidade ao faixa marrom (castanha) para que o mesmo tenha um
desenvolvimento técnico ao nível dos faixas pretas – só então será aprovado!
Todos os instrutores de Vias Marciais japonesas sabem exatamente do que eu estou
falando em se tratando de exame para Shodan! Aquele venerado "ritual de passagem" do mundo dos Kyû para o mundo dos Sensei... Mas vamos usar o cérebro um
pouquinho: se o instrutor é brando nas faixas que antecedem à faixa marrom (castanha)
– isto é: amarela, laranja, verde e azul – como pode o instrutor esperar um
desempenho elevado num faixa marrom (castanha) quando o próprio instrutor não manteve
este nível elevado desde o começo?
“Os faraós tinham razão, a
solidez está na base!”
Se determinados níveis de exigência fossem mantidos desde cedo, um faixa marrom (castanha) chegaria a um exame de faixa preta sem qualquer problema (técnico e teórico) e as exigências ridiculamente elevadas e impostas não existiriam. É tão simples como isso! Porque, se mantido um nível de instrução elevado, seria um exame a mais entre tantos feitos pelo aluno e o orgulho por ser aprovado para faixa amarela seria idêntico ao orgulho de se tornar faixa preta, uma vez que toda faixa (tenha ela a cor que for) representa – ou deveria representar – o grau de conhecimento efetivo dos alunos.
Infelizmente, essa forma leviana e descompromissada de ver os Kyû é comum para mais de 98% dos instrutores… estes mesmos
instrutores que irão exigir um exame irracional para faixa preta como se o
aluno faixa marrom (castanha) tivesse a obrigação de saber TUDO sobre a parte técnica da arte que pratica!
Conclui-se que atribuir maus
desempenhos aos faixas marrons (castanhas) talvez seja apontar o problema na direção
errada e talvez uma (re)avaliação de como se conduz o ensino técnico (e teórico) nas graduações preparatórias (faixas coloridas) talvez seja muito mais benéfico
e efetivo para a arte que se ensina a curto e longo prazos.
Cumpre-me, porém, lembrar que a
forma como orientamos os nossos alunos é uma questão de escolhas: queremos o
melhor a nível técnico e teórico para os nossos alunos ou “seja lá o que Deus
quiser”? Qual realmente é a nossa motivação no ensino das Vias Marciais
japonesas? Tem-se ou não interesse sobre a "qualidade" do ensino que prestamos?
Infelizmente a coisa acaba sendo assim, uma distribuição de graduação. No meu caso, só permito a meus alunos, sejam eles de qualquer grau, prestar exame caso eu desse o conceito "A" sendo avaliador. Se ainda estiver oscilando entre "A" e "B", não realiza o exame. O desempenho na prova real acaba tendo outros fatores (pressão, nervosismo, etc) que podem fazer a nota cair, mas durante a aula é "A". Apesar de saber que muitos não concordam com esse método, acredito que para que a pessoa passe de uma faixa a à outra, branca para amarela, por exemplo, ela não deve ser "um faixa branca que merece passar para amarela"; deve ser avaliado como "agora ele é um faixa amarela, sem dúvida, mas que ainda está com uma faixa branca na cintura. Pode trocar". Osu!!!
ResponderExcluirProblemas de avaliação!!! No entanto já vi reprovações para faixa amarela em júri de que eu fazia parte...
ResponderExcluirTotalmente de acordo com Brandel Filho, pois há que ter em conta a responsabilidade do "instrutor/treinador/mestre" ao propor um aluno para exame.
Mas como o exame é pago, pois existe uma taxa, normalmente... bem, fico por aqui! Posso escrever algo de que alguém não goste!
Grande abraço aos dois!